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A Economia do Manejo Florestal Sustentável na Amazônia

Mais de 770 mil hectares da região amazônica do Brasil foram desmatados em 2019, sendo que pelo menos um terço desta área poderia ter sido manejada de forma sustentável para obtenção de madeira.

Ricardo Leitão, Alison Hoare, Thiago Uehara and Anum Farhan, 8 April 2021

A floresta Amazônica é essencial para a saúde do mundo, responsável por absorver 5% de todo o dióxido de carbono gerado pela atividade humana e desempenhando um papel importante no apoio às economias rurais através da colheita de madeira e outros produtos. No entanto, grandes áreas da Amazônia estão sendo desmatadas todos os anos, principalmente para agricultura, muitas das quais ilegalmente.

A legislação brasileira normalmente exige que 80% das terras privadas na Amazônia permaneçam como floresta – podendo ser utilizada para aproveitamento de madeira e outros produtos florestais seguindo um plano de manejo sustentável aprovado por uma agência ambiental local. No entanto, essa exigência nem sempre é aplicada e o desmatamento ilegal de florestas tem sido generalizado como resultado de um modelo econômico que pressupõe a expansão agrícola como o melhor caminho para o desenvolvimento.

No entanto, uma abordagem baseada no manejo sustentável também pode gerar benefícios econômicos significativos. A área ilegalmente desmatada em 2019 poderia ter gerado um valor estimado em 1.5 bilhão de dólares em receitas com a venda de madeira e 220 milhões de dólares em impostos sobre vendas. E isso tudo em apenas um ano, evidenciando que o manejo florestal pode trazer retornos em curto, médio e longo prazos.

O potencial econômico do manejo florestal sustentável

Para estimar a receita potencial do manejo florestal para madeira, consideramos as áreas ilegalmente desmatadas em 2019 que poderiam ter sido usadas para a extração de madeira.

Em 2019, mais de 770 mil hectares da floresta amazônica foram desmatadas no Brasil em 2019, sendo que apenas apenas 2.122 hectares foram autorizados pelos órgãos competentes, enquanto 475 mil hectares foram desmatados ilegalmente em territórios protegidos, como unidades de conservação e terras indígenas – o que significa que pelo menos 293 mil hectares das terras desmatadas ilegalmente poderiam ter sido manejadas de forma sustentável.

Estimamos o volume e o valor da madeira serrada – o principal produto comercial de madeira das florestas tropicais do Brasil - que poderia ter sido extraída de forma sustentável nesta área. Os valores foram baseados em projetos correntes de concessão florestais com certificação FSC fornecida por empresas locais, ONGs e agências governamentais.

Os dados mostram que as colheitas típicas são de 16 m3 por hectare, dos quais 35% (5,6 m3 por hectare) são transformados em madeira serrada. O restante são aparas de madeira, lenha e resíduos. Portanto, de 293.052 hectares de floresta, seria esperado 1,6 milhão de m3 de madeira serrada.

A maior parte da madeira colhida na Amazônia - 91% de acordo com o Imaflora - é vendida no Brasil. No mercado interno, o preço médio da madeira serrada é de US$ 875,4/ m3, enquanto que, para exportação, o valor pode alcançar US$ 1650/m3. Seguindo essa proporção, para uma colheita de 1,6 milhão de m3, alcançamos estimativa de venda de madeira serrada de 1,5 bilhão de dólares.

Essas vendas poderiam, por sua vez, ter gerado receitas fiscais para os governos estaduais em um valor de até US$ 222 milhões. O ICMS é aplicado em média a uma alíquota de 17% (12% no estado de origem e 5% no estado de destino).

Portanto, os 293 mil hectares desmatados ilegalmente em 2019 tivessem sido manejados de forma sustentável, mais de US$ 1.5 bilhão em receitas com venda de madeira teriam sido gerados, assim como até US$ 222 milhões em impostos para os governos estaduais. Além do mais, as florestas ainda estariam em pé.

Tais estimativas podem ser consideradas conservadoras por três motivos. Em primeiro lugar, a área de florestas degradadas - cuja área é maior que a área desmatada - não foi considerada. Embora a colheita potencial de terras desmatadas possa ter sido superestimada, uma vez que é provável que essas terras incluíssem florestas anteriormente degradadas, isso ocorreria em uma escala muito menor.

Em segundo lugar, apenas os valores da madeira serrada foram considerados. A venda de outros produtos, como lenha e lascas de madeira, ou a produção de produtos de maior valor agregado, poderia ter gerado receitas adicionais significativas.

Em terceiro lugar, as receitas fiscais, como imposto de renda, previdência social e outros tributos, não foram incluídas no cálculo.

Chamada para ação

A posição do Brasil no mundo tem mudado nestes últimos 10 a 15 anos. Anteriormente, o país figurava enquanto uma estrela em ascensão no Sul Global e um parceiro comercial de confiança. No entanto, nos últimos anos, o país tem se tornado mais isolado à medida que a censura internacional tem aumendado em resposta às taxas crescentes de desmatamento e incêndios florestais generalizados na Amazônia.

A França e a Irlanda, por exemplo, ameaçaram bloquear a aprovação do acordo comercial da União Europeia com o Mercosul devido a preocupações quanto à resposta do governo aos incêndios florestais na Amazônia. Da mesma forma, investidores têm também exigido ações e, mais recentemente, o novo presidente dos EUA, Joe Biden, pediu ao Brasil que combata o desmatamento ou enfrente ‘consequências econômicas’ .

A menos que novas abordagens sejam adotadas no Brasil, o risco é de perda não apenas da floresta amazônica como também de oportunidades de desenvolvimento econômico. Com as mudanças climáticas e a perda de biodiversidade no topo da agenda internacional, mudanças regulatórias destinadas a reduzir o impacto do investimento e do comércio nas florestas também estão no horizonte. Por exemplo, os EUA e a Europa vêm considerando aumentar os controles de importação de commodities agrícolas associadas ao desmatamento.

É chegado o momento de o Brasil adotar uma nova abordagem. Medidas para promover florestas e modos de vida e de subsistência sustentáveis ​​na Amazônia são apoiadas pela maioria dos cidadãos no Brasil, com 83% da população indicando sua preocupação com a perda da Amazônia.

Além disso, plataformas multistakeholder como a Coalizão Brasil sobre Clima, Florestas e Agricultura que exploram modelos de desenvolvimento alternativos, também vêm ganhando força.

Não é possível colocar um preço na floresta amazônica, até pelo seu imenso valor social, cultural e ecológico. No entanto, garantir que todo o seu valor econômico seja considerado é de fundamental importância para ajudar os tomadores de decisão a determinar a melhor forma de estabelecer uma economia verdadeiramente resiliente e sustentável.

O autor agradece as seguintes pessoas: Alex Marega, SEMA MT; André Luiz Campos de Andrade, Ministério da Economia; Dalton Cardoso, Imazon; Fabio Bernardes, SEFA PA; Gustavo Bidiaga, IBAMA; Joaquim Levy, Safra Bank; Jose Humberto Chaves, Serviço Florestal Brasileiro; Leonardo Martin Sobral and Marco Lentini, Imaflora; Secretario Mauro de Almeida, SEMAS PA; and Paula Bernasconi, ICV. Obrigado também à Taciana Kanashiro e Sérgio Bunioto pela edição da tradução. Todos os erros são responsabilidade do autor.

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